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A partir da Baixa Idade Média, vemos que a Europa experimentou as transformações que favoreceram o aparecimento da sociedade burguesa. A partir dali, a economia conviveria durante muito tempo com essa classe responsável pelo desenvolvimento das atividades comerciais. De fato, podemos revelar ao aluno que as formas de compreensão da burguesia variaram de forma bastante significativa ao longo do tempo.
Para demonstrar isso ao aluno, oferecemos a discussão de dois textos, um do século XIII e outro do século XVI. Por meio desse intervalo de tempo de quase trezentos anos, o aluno pode ver que a percepção sobre a burguesia variou bastante. Segue abaixo os dois documentos a serem trabalhados.
“O usurário que adquirir um lucro sem nenhum trabalho e até dormindo, o que vai contra a palavra de Deus que diz: “Comerás teu pão com o suor do teu rosto”. Assim o usurário não vende a seu devedor nada que lhe pertença, mas apenas o tempo, que pertence a Deus. Disso não deve tirar nenhum proveito.” (Teólogo do século XIII. Jacques Le Goff. A bolsa e a vida. São Paulo: Brasiliense, 1989.)
“Deus chama cada um para uma vocação particular cujo objetivo é a glorificação dele mesmo. O comerciante que busca o lucro, pelas qualidades que o sucesso econômico exige: o trabalho, a sobriedade, a ordem, responde também ao chamado de Deus, santificando de seu lado o mundo pelo esforço, e a sua ação é santa.” (João Calvino. In: Roland Mousiner. Os séculos XVI e XVII: os processos da civilização europeia. São Paulo: Difed, 1973)
Uma primeira questão bastante curiosa a ser debatida nesses dois documentos é o fato de ambos serem organizados por autoridades religiosas. É de grande valia questionar as razões pelas quais o teólogo e João Calvino apresentam opiniões tão diferentes sobre as atividades burguesas. Por meio dessa questão, podemos salientar que o teólogo fala da burguesia no início de sua consolidação pela Europa. Por sua vez, Calvino registra sua opinião em uma época de grande repúdio aos valores eclesiásticos.
No primeiro texto, observamos um franco ataque ao empréstimo de dinheiro como sendo uma atividade de natureza pecaminosa. Segundo o teólogo, a usura é uma atividade em que o indivíduo alcança o lucro sem trabalhar e vendendo o tempo, uma propriedade divina ao seu devedor. Com isso, o clérigo do século XIII aponta que uma das mais lucrativas atividades da burguesia, era envolta por uma noção de pecado que marginalizava essa classe do ponto de vista religioso e social.
No segundo, João Calvino aponta que as atividades burguesas – ao lado de qualquer outra forma de trabalho – são fruto de uma vocação concedida por Deus. Na medida em que exerce suas atividades com presteza e disciplina, o burguês atinge uma condição positiva. O papel econômico burguês é claramente reinterpretado como algo positivo, ou seja, a antiga noção de pecado ligada ao empréstimo de dinheiro cede espaço para o alcance da graça divina.
Revelando tais aspectos em sala, o aluno tem chances de entender que as formas de o homem enxergar o mundo se transformam ao longo do tempo. Indo do século XIII ao XVI, ele tem a oportunidade de trabalhar as mudanças que marcaram a passagem entre a Idade Média e a Idade Moderna. Além disso, a sua capacidade de interpretação é colocada ao lado da percepção dos diferentes contextos históricos em questão.
Por Rainer Sousa
Graduado em História
Equipe Brasil Escola