O conteúdo relativo ao período da Idade Moderna e, em especial, ao tema do “Descobrimento” é um dos que mais produziram e ainda produzem discussões entre historiadores. Essas discussões, não raro, excedem o terreno acadêmico e acabam permeando outras áreas, como as artes. É o caso do filme “1492: A Conquista do Paraíso”, de 1992, dirigido por Ridley Scott e produzido conjuntamente em três países: França, Espanha e Alemanha. Os problemas abordados no filme de Scott podem ser muito úteis se explorados em sala de aula.
O filme, obviamente, faz referência à data de descobrimento da América por Cristóvão Colombo (1492), e seu subtítulo, “Conquista do Paraíso” (Conquest of Paradise), traduz uma ambiguidade fundamental inerente a esse acontecimento histórico. O termo“conquista” pode significar “triunfo” da navegação e dos reinos modernos europeus e, ao mesmo tempo, significar “submissão”, “captura” daquele novo mundo então conhecido ou “o paraíso”.
O uso da palavra “conquista” pelo diretor já oferece ao professor um pontapé inicial de discussão. Essa palavra pode ser contrastada com a palavra “descobrimento”, de uso mais corrente, porém com significado que pode se restringir à dimensão de aventura e de “achado”. Historiadores como Janice Teodoro e Tzventan Todorov (debatedores do tema) podem auxiliar o professor na preparação da aula sobre esse filme.
A base da narrativa do filme, escolhida por Ridley Socott – que também já dirigiu outros clássicos do cinema histórico, como o “Gladiador” (2000) –, foi construída a partir de documentos históricos, como os diários de Colombo, as memórias do filho de Colombo, Fernando, e parte das obras do padre jesuíta espanhol Bartolomeu de Las Casas, que foi missionário nas colônias espanholas e caracterizou-se pela ferrenha defesa dos nativos.
A trama desenvolve-se em três fases: 1) a organização da viagem que será empreendida pelo navegador genovês, então contratado pela coroa espanhola. Nessa fase, opta-se por uma representação heroica clássica de Colombo e uma representação paradisíaca e pueril da terra “descoberta” e de seus habitantes. 2) Retrata-se o regresso à Europa e os preparativos para nova viagem e a conquista, de fato. 3) Dá-se ênfase às contradições humanas, tanto na figura de Colombo, interpretado pelo ator Gérard Depardieu, quanto nas pessoas que estão mais próximas a ele e também aos nativos americanos. Toda a narrativa, associada à superprodução (cenários, figurino, grandes atores, etc.), consegue captar razoavelmente a atmosfera do período e a dimensão dos problemas que o encontro entre europeus e nativos americanos desencadeou.
Não pare agora... Tem mais depois da publicidade ;)
O professor pode, após a exibição do filme, apresentar uma atividade aos alunos que os faça refletir sobre a questão do “descobrimento” e da “conquista”, como foi apresentado acima. Para tanto, um texto das fontes usadas no filme, como o de Las Casas, que disponibilizamos abaixo, pode ser de grande valia.
“Àqueles que pretendem que os índios são bárbaros, responderemos que essas pessoas têm aldeias, vilas, cidades, reis, senhores e uma ordem política que, em alguns reinos, é melhor que a nossa […]. Esses povos igualavam ou até superavam muitas nações e uma ordem política que, em alguns reinos, é melhor que a nossa […]. Esses povos igualavam ou até superavam muitas nações do mundo conhecidas como policiadas e razoáveis, e não eram inferiores a nenhuma delas. Assim, igualavam-se aos gregos e aos romanos, e até, em alguns de seus costumes, os superavam.” (LAS CASAS, B. (1550). apud LAPLATINE, François. Aprender antropologia. São Paulo: Brasiliense, 1987, 37-39.)
Outra sugestão, se o professor dispor de tempo na escola em que trabalha, seria estabelecer um contraste entre o filme de Scott e o filme “Apocalipto”, de Mel Gibson, que apresenta as contradições das próprias civilizações ameríndias, mostrando o quão complexo pode ser o processo histórico.
Por Me. Cláudio Fernandes