A Segunda Guerra Mundial foi um dos conflitos mais importantes de todos os tempos e redefiniu, além do mapa, a geopolítica do mundo no século XX. Ao longo dos seis anos desse conflito, mais de 60 milhões de pessoas morreram, e eventos marcantes e importantíssimos aconteceram. Um dos eventos mais marcantes da Segunda Guerra foi o bombardeio das cidades de Hiroshima e Nagasaki com as bombas atômicas nos dias 6 e 9 de agosto de 1945.
O bombardeio das duas cidades japonesas foi um desdobramento dos conflitos travados entre Estados Unidos e Japão durante a Segunda Guerra. O conflito entre as duas nações iniciou-se após o ataque surpresa contra a base naval dos americanos localizada em Pearl Harbor, em dezembro de 1941.
O conflito que se seguiu a partir daí foi marcado inicialmente por vitórias dos japoneses, sobretudo no sudeste asiático, o que garantiu posições estratégicas para os japoneses na guerra, principalmente porque essas regiões proporcionaram ao Japão recursos importantes para manter a economia do país em pleno funcionamento durante a guerra.
O ponto de virada ocorreu a partir da Batalha de Midway, na qual os americanos conquistaram uma vitória vital que custou parte considerável da Marinha Imperial do Japão. A partir daí, o Japão amargou uma série de derrotas, que lhe custaram inúmeros territórios. Além disso, o enfraquecimento da Marinha japonesa resultou na falta de abastecimento da ilha, uma vez que grande parte dos recursos consumidos do Japão era enviada por navios.
No entanto, apesar do notório enfraquecimento, cada vitória americana era obtida somente a um custo altíssimo, sobretudo em vidas humanas. Isso se devia à formação cultural do soldado japonês, doutrinado a resistir até a morte, uma vez que a derrota na cultura japonesa era inaceitável e vergonhosa.
Assim, em 1945, vitórias importantes aconteceram em Iwo Jiwa e Okinawa, o que levou os Estados Unidos ao seguinte passo: a campanha de invasão e conquista da ilha principal, Honshu. A invasão da ilha principal, no entanto, aterrorizava as lideranças americanas pela quantidade de mortos americanos que causaria e pela possibilidade de sua extensão por tempo indeterminado, uma vez que os japoneses resistiam até a morte.
Assim, os americanos optaram pela utilização de suas duas bombas atômicas sobre duas cidades japonesas de forma a causar uma intensa destruição e forçar o Japão a se render sem que fosse necessário promover a invasão territorial de Honshu. Assim, foram lançadas as duas bombas atômicas, que causaram milhares de mortes e deixaram graves sequelas em outros milhares. A rendição japonesa ocorreu no dia 14 de agosto de 1945 e foi oficializada em 2 de setembro do mesmo ano.
Alternativas de ensino da Guerra do Pacífico
Esse contexto que foi apresentado possui outras formas de ser trabalhado em sala de aula, além das aulas convencionais baseadas no livro didático e exposição conteudista. Sim, é necessário que um tempo da aula seja utilizado para exposição prévia do contexto abordado. No entanto, é sempre importante considerar que outras abordagens e a utilização de diferentes mídias podem ser alternativas interessantes, que, além de despertar o interesse do aluno, podem ser também uma abordagem menos maçante. Além da utilização de filmes, documentários e imagens, podem ser utilizadas alternativas mais próximas do gosto dos alunos.
É evidente que atualmente existe um consumo crescente de quadrinhos em geral, seja na sua versão ocidentalizada (conhecida como comics ou graphic novels), seja na versão orientalizada (conhecida como mangá). Uma alternativa interessante que pode ser utilizada para realizar o estudo dos bombardeios atômicos é um mangá japonês escrito por Keiji Nakazawa (quadrinista japonês falecido em 2012).
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A obra produzida por Keiji Nakazawa trata especificamente do bombardeio atômico sobre a cidade de Hiroshima e leva o nome de Gen Pés Descalços (Hadashi no Gen, no original em japonês). Foi produzida durante a década de 1970 e reproduz, em parte, as experiências vividas pelo próprio autor enquanto sobrevivente do bombardeio.
O personagem principal, Gen Nakaoka, é um alter ego de Keiji Nakazawa, que reproduz de maneira intensa o que ele presenciou pessoalmente após sobreviver ao bombardeio em Hiroshima. Além disso, muitas outras histórias trazidas em Gen são frutos de depoimentos que ele colheu ao longo de sua vida. A história criada por Nakazawa foi organizada em dez volumes, que foram recentemente publicados integralmente no Brasil.
O grande diferencial de Gen Pés Descalços é a apresentação de uma versão alternativa e contundente sobre os acontecimentos desse período que diverge da versão oficial que se popularizou no Japão após a Segunda Guerra. A obra de Nakazawa é crítica e apresenta de maneira aberta toda a crueldade do regime militarista japonês do período sem isentar os americanos por utilizarem uma bomba atômica sobre civis.
Pontos importantes que Gen aborda
Alguns pontos que Gen Pés Descalços aborda e que podem ser utilizados para contextualizar e aprofundar algumas questões relativas a esse contexto são:
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Nacionalismo e militarismo: ao longo da história, inúmeras críticas foram feitas ao regime japonês liderado pelo imperador Hirohito. Diferentemente do que acontece no Japão atualmente, a obra não esconde a responsabilidade do Japão na desgraça que foi lançada sobre eles em 1945. Assim, são abordadas as violências cometidas pelo Japão em outras partes da Ásia, assim como a perseguição à população que não fosse favorável à continuidade da guerra. Existe uma crítica contundente também ao papel do imperador;
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Intensidade das imagens: pela falta de registros visuais pontuais, existe uma certa dificuldade para aqueles não familiarizados com o poderio da bomba de imaginar as consequências de seu uso sobre seres humanos. Nesse quesito, Gen é impactante e retrata pessoas com corpos mutilados, com a pele e olhos derretidos pelo calor espalhado pelo impacto da bomba etc. Acerca dos efeitos da bomba atômica, sugiro a leitura do texto deste link;
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Preconceito: o quadrinho de Nakazawa aborda o preconceito com os sobreviventes da bomba em diferentes partes do Japão. A grande crítica aponta que a mesma população que incentivou a guerra a todo custo negou-se a ajudar as vítimas dos bombardeios atômicos;
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Atuação dos americanos: primeiro, existe uma crítica contundente contra a utilização da bomba atômica pelos Estados Unidos contra alvos civis. Segundo, existe uma crítica contra os americanos após a ocupação do Japão: censura contra aqueles que denunciassem a crueldade da bomba e a exploração da população a partir de testes científicos realizados nos sobreviventes para estudar os impactos da bomba sobre o corpo humano.
Esses são apenas alguns pontos que podem ser explorados em sala, mas fica a critério da abordagem de cada professor. De qualquer forma, pode ser solicitada aos alunos a leitura completa ou parcial de determinados volumes ou podem ser reproduzidas em sala algumas partes específicas dessa obra. Como sugestão, a exploração dessa obra em sala de aula pode ser complementada com a reprodução das animações que foram feitas a partir da adaptação desse mangá.
Por Daniel Neves
Graduado em História